
Dizem que em Porto Velho há uma rua tão famosa que já merecia série documental: a lendária Rua Capão da Canoa, no bairro Três Marias. Anunciada, reiniciada, revisada e novamente prometida, a obra virou símbolo de uma gestão que muda de prefeito, mas não muda de enredo. O asfalto? Esse continua tão distante quanto o fim da poeira — ou o começo da lama.
Um passado que já virou história
Dizem que o projeto original da Capão da Canoa foi lançado ainda durante a gestão do ex-prefeito Hildon Chaves, quando Porto Velho ainda acreditava em milagres de asfalto. Contudo, não encontrei fontes confiáveis que indiquem datas exatas de início da obra sob aquele governo (ou, talvez, as datas tenham sido engolidas pela areia da lenda política).
O que se sabe é que, mesmo após dois mandatos completos de Hildon, o “milagre asfaltístico” nunca se concretizou por inteiro — afinal, oito anos aparentemente foram pouco para completar uma única rua.
Promessas, aditivos e trocas de comando
Em 2025, surge no horizonte o novo prefeito Léo Moraes (Podemos), herói promissor com agenda cheia e promessas mais ousadas. Logo no início de sua gestão, a Prefeitura publicou que fariam as “devidas correções no projeto” da Capão da Canoa — como se fosse algo trivial. A matéria oficial dizia que, corrigido o plano original, “agora é questão de honra” finalizar a via.
Mas como todo herói em narrativa, Leo Moraes enfrentou seus próprios obstáculos: agosto passou, setembro veio, e a tão aguardada entrega em 30 de setembro — amplamente divulgada — parece ter escorregado dos calendários. Hoje, estamos quase em meados de outubro e a rua continua no mesmo estado (ou pior, porque chove e lama se multiplica).
Enquanto isso, a empresa contratada Madecom (citada em reportagens de 2024 como executora do asfaltamento da Capão da Canoa) já sabe o caminho das pedras — ou dos aditivos — e solicitou prorrogações de prazo para a conclusão.
Valores, entraves e retomadas parciais
Uma notícia oficial publicada pela Prefeitura em 30 de julho de 2025 informa que as obras seriam retomadas “na próxima semana”, citando entraves técnicos identificados no projeto original. Essa publicação traz dados: o valor total do contrato é de R$ 8.107.463,54, dos quais R$ 7.871.493,00 vêm de recurso federal (emenda parlamentar) e R$ 236 mil são contrapartida municipal. 
Também consta que o contrato envolve outras vias além da Capão da Canoa — Salto do Céu, Serra Dourada, Liberdade (bairro Três Marias) e Genebra, Montserrat (bairro Novo Horizonte).
A obra, segundo relatos, sofreu paralisações por erros técnicos — interferências não mapeadas, redes de água antigas, necessidade de ajustes — e até exigiu aprovações junto ao Ministério da Defesa (sim, não é piada — consta que houve envolvimento de trâmites burocráticos além da conta).
Em abril de 2025, a Prefeitura anunciou que a obra da rua Capão da Canoa havia sido retomada depois de “mais de um ano parada por erro técnico no projeto original”. No mesmo anúncio, o prefeito declarou que o reinício marcava o fim da espera.
Já em 6 de maio de 2025, foi veiculada matéria de que os trabalhos avançavam na fase de implantação da rede de drenagem, com previsão oficial de conclusão em “até quatro meses”. Mas “até quatro meses” nunca é certeza — especialmente quando falamos de obras municipais.
Quando os prazos viram lenda
Se a data de 30 de setembro parecia tão sólida quanto uma fundação bem feita, a realidade tratou de mostrar que não. Que ninguém se engane: o prazo foi anunciado, amplamente divulgado, mas nunca cumprido. Agora, o inverno se aproxima — e, com ele, a profecia se cumpre: mais lama, mais poeira e mais impaciência para quem vive ali.
Em 26 de setembro de 2025, a Prefeitura informou que está instalando um “tubão” de dois metros de diâmetro para dar vazão à água, relativamente perto da Capão da Canoa, para evitar futuros alagamentos. Ou seja: ainda se está discutindo drenagem, enquanto se esperava que tudo já estivesse pronto..jpg)
Entre protestos e resignações
Os moradores da região já deram sinais de cansaço — protestaram, fecharam a BR-364 em ocasiões anteriores, chamaram a atenção para o abandono da via. Mas parece que essa “manifestação periódica” virou parte integrante do calendário local, como se fosse evento cultural anual. Já não causa mais espanto.
E há quem cogite novamente o fechamento da BR-364 como forma de pressão. Afinal, poucas coisas mobilizam tanta atenção quanto paralisações em estrada federal.
O jogo de dominós entre governo municipal e estadual
É importante lembrar que Três Marias (Fortaleza) tem algumas ruas sob domínio do Governo de Rondônia, via programas como o “Thau Poeira” — ironicamente nome apropriado para as condições de lama que se tornam recorrentes no local.
Se o prefeito que mora (e “anda”) em Porto Velho não consegue acertar o caminho de uma rua, imagine quem só “aparece” para campanha estadual. Há rumores nos corredores do CPA de que o governador Marcos Rocha passa por Porto Velho como turista político, mais ocupado em fazer marqueting do que gerenciar o que chama de “capital estadual”.
Conclusão (com tom de desabafo)
Essa Rua Capão da Canoa já deveria ser patrimônio imaterial da paciência: projeto lançado, cancelado, revisado, readaptado, prometido, adiado e eterno. Se o inverno e a chuva trazem “benefícios” — como reforçar que a obra nunca existiu integralmente —, aos moradores resta muita fé e um conselho ancestral: “Reformem suas canoas, porque a água já bate à porta.”
Que a Capão da Canoa pare de ser piada, ou pelo menos vire uma lenda que, desta vez, seja contada com inauguração — e não só com promessas.
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